Friday, January 27, 2006

e depois, o sul

o frio de janeiro, o inverno, preenche o vazio abismal dentro de mim.
cresce e enregela-me cada parte do meu corpo.
o frio é o meu sangue.
todos os dias, o caminho a percorrer é tão igual.
conheço tão bem os meus passos...
as pedras marcadas pelo tempo, pelos passos, pelas pessoas.
naquele dia frio, em que o frio do janeiro e o inverno, me preencheu o vazio em mim,
também tinha percorrido aquele caminho,
aquelas pedras marcadas pelo tempo.
conheço tão bem aqueles passos.
conheço tão bem este frio que me preenche,
este sentimento que não me aquece.
conheço bem os meus passos,
aquelas pedras marcadas pelo tempo e pelos passos e pelas pessoas.
naquele dia de frio de janeiro,
avancei, na escuridão que parecia não ter fim,
e dentro de mim, tudo, o medo, esperava por algo que sabia que ia acontecer.
os passos que eu conhecia tão bem fizeram-me avançar.
peguei naquele objecto imóvel, que tantas vezes perigoso, agora me fascinava.
o frio de janeiro e do inverno era intenso e enregelava aquele objecto.
peguei nele e tremia, não sei se do frio se do medo.
o medo olhava de dentro de mim através do transparente dos meus olhos.
peguei no objecto imóvel, escolhi uma bala e carreguei-o.
naquele momento nada mais existia.
as paredes da casa, as janelas,
as pedras marcadas pelo tempo, pelos passos, pelas pessoas, as pessoas.
a vida.
apenas eu e a escuridão que me envolvia em mais escuridão.
e eu ali, nu, impotente contra o frio de janeiro e do inverno.
levei a arma à boca e o seu frio fez-se sentir,
o seu gosto a metal inundou a minha boca, os meus dedos trémulos e frios agarravam o gatilho.
quando apertei o gatilho, o lábio ardeu e senti-lhe o sabor, mas já não interessava.
a bala tinha atravessado todo o seu caminho,
um caminho que conhecia tão bem.
e eu caí, inerte e frio, morto.
o meu corpo virado para sul.
o sangue da minha cabeça agora desfeita brilhava na escuridão.
e depois disso, nada interessava.
o medo, que se preparara para algo que sabia ir acontecer, desaparecera.
o frio de janeiro, do inverno, perdia-se em mais frio daquele dia.
as pedras continuavam lá, as pedras que eu conhecia tão bem,
pedras marcadas pelo tempo, pelos passos, pelas pessoas.
e eu, caminhava um novo caminho,
um caminho que conhecia bem,
caminhava para sul.



by
Ghost Reverie

Tuesday, January 24, 2006

saudades

para quem não sabe, foram os portugueses que inventaram esta palavra. e arrisco-me mesmo a dizer que inventaram este sentimento. é que não conheço povo tão saudoso como nós.
e é claro, eu, como bom português que sou, sou extremamente saudoso.
tenho saudades de vós, mas especialmente de ti.
tu que me fazes sonhar
tu que me inspiras
tu que me dás vida por dentro.
sinto especialmente saudades de ti.
não me perguntes porquê. mas sinto.

olho para o espelho e pergunto-me se serei mesmo eu, a pessoa que não acreditava em sentimentos, saudades...
serei mesmo eu que me vejo reflectido no espelho?
é que a culpa é tua! tu foste (e és) o vento da mudança que soprou em mim.

e verdade seja dita: bendita a hora em que o fizeste.

sim sinto saudades de ti.


by
Ghost Reverie